30 May 2008

Um manual pessoal anti-road rage

Estava a tentar fugir à tentação de contar algo curioso que me aconteceu no trânsito hoje para não banalizar neste blogue as situações de road rage, que têm sempre um encanto tão especial para quem as vive. A verdade é que não há nada mais violentamente patético que alguém a contar a sua própria situação de trânsito do dia, como eu faço todos os dias.

Com essa consciência, tento combater a tendência inicial, enquanto vivo a situação.

Imagino-me visto do lugar do passageiro do outro carro: com o vidro fechado, a berrar em silêncio com os olhos raiados de sangue e as sobrancelhas franzidas como um gorila não dominante a ser levado do parque numa jaula pequena num Nissan Patrol.

Quando não funciona (nunca funciona, é tudo muito rápido), imagino-me visto do lugar do passageiro do meu carro: igual mas com dobragem em português vernacular, acima do limite estabelecido por lei. Imagino um conhecido a quem dei boleia a ficar assustado ou uma namorada farta dos meus ataques de rinocerôncia.

Como último recurso imagino-me uma pessoa famosa e como as pessoas famosas ficam mal quando mostram que são terrenas e se irritam em público, e perdem a razão e estalam o verniz. Um Brad Pitt, não, um João Pedro Pais alterado.

Raramente alguma destas coisas funciona.
Acabo por seguir irritado depois de berrar e buzinar a uma velhinha com putos atrás. Chego ao atelier e invariavelmente as palavras são mais fortes que a minha garganta, e contam a história ao Vasco ou ao António, é incrível a minha figura, histórias sem interesse nenhum "a velha não fez pisca, tás a ver?!" e no fim sinto-me mal, no fim sinto-me mesquinho e frustrado.

No fim, invariavelmente, para me sentir melhor, não sei porquê, acabo sempre por contar a vez em que um tipo enorme sem dentes saiu do carro e me queria bater, ameaçando abrir a porta do meu carro, violentamente, a dizer que me matava, enquanto eu, superior à mediocridade da estrada, fiquei dentro do carro, à espera ansiosamente que o semáforo abrisse ou que ele se cansasse antes de partir o vidro. Não costumo contar que tranquei as portas assim que o vi pelo retrovisor a sair do carro, não vale a pena humilhar-me por pormenores.

3 comments:

xolitos said...

"um João Pedro Pais alterado", hihihihiihihii hihih ihihi hihihihih
hi hihi hihi hihi.

um parvo qualquer said...

não no sentido transgénico, mas enraivecido.

xolitos said...

"um João Pedro Pais alterado" é tipo "uma madre Teresa de Calcutá sensual"